quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

VOCÊ CONHECE A EXPRESSÃO QUEIMA RAPARIGAL?

         QUEIMA RAPARIGAL
Industriário era fabricante. E comerciante era caixeiro. Daí é que veio o nome Fênix Caixeiral , uma entidade que reúne o pessoal do comércio e que fazia festas homéricas na Praça José de Alencar , num prédio que , como acontece nesta cidade , com a memória, foi destruído. Os patrões eram fechados em copas, não conversavam com seus empregados. Somente o cumprimento limpo e seco do bom – dia, boa – tarde , além dos carões pela falta de observância das obrigações , como varrer o chão, limpar a sentina todo dia pela manhã , após as 10 horas colocar um toldo em frente a loja para evitar o sol. Era função do contínuo o menor na escola hierárquica das lojas. Pegava um cavalete subia e colocava o toldo , com a obrigação igualmente , de no fim da tarde retirá – lo. O fabricante era mais humilde. Era justamente aquele com um contato maior com as máquinas , os teares , o algodão. Saía todo cheio de sujo proveniente do estafante trabalho. Pelo menos isso é o que acontecia na fábrica do Tô Diogo , na esquina da Duque de Caxias. Essa fábrica tinha importância decisiva em nossa vida. Ela ligava uma sirene às 10:30 servindo como relógio e orientação para os demais moradores da rua, que não eram fabricantes, nem funcionários do escritório.
Como homem mais rico o Tô Diogo recebia muitas visitas da meninada . E para furar os cartões da Obra das Vocações Sacerdotais. Um tostão, ou dez centavos, cada furo, em benefício da formação de nossos padres. Além desses cartões tudo que era rifa era levada para o dono da fábrica. Ele , pacientemente, atendia a todos. Às vezes coincidia de mais de um pedinte. O bom rico fazia então uma divisão, para que ninguém saísse sem donativo.
Esses detalhes são conhecidos por quem morou na Imperador ou adjacências. Pessoas que relembram com saudade as cousas simples que aconteciam. Simples e sérias, embora hoje os mais novos riem quando estes episódios são contados. Como aquele do Raimundão e sua bandeira , no Hotel Majestic , nos altos do bar e cinema de mesmo nome. Eram assim como uma república onde viviam somente homens. Entre eles, por ironia do destino, o Raimundão um dos primeiros homossexuais da cidade. O Raimundão era previdente. Quando tinha clientes em seu quarto ele pegava uma camisa e hasteava como uma bandeira do lado de fora da janela. Ninguém subia para não atrapalhar o idílio. Aguardava sua vez. Aquele outro do pega pinto do Mundico. Era um quartinho bem pequenininho , onde não cabiam nem dez pessoas , Pois bem, numa noite de um sururu violento na Praça do Ferreira , com tiros e mãozada no péduvido , sem falar nos sabacus e dedadas correu todo mundo para o botequim do Mundico. E, segundo o Geraldo Fontenele contava na época , aglomeravam – se naquele local mais de 100 inclusive duas mulheres barrigudas , sem falar em crianças e cachorros.
Foi nesse tempo que aconteceu um episódio interessante. Foi o incêndio acontecido na Pensão Paraibana , na Conde D’eu , por trás do Mercado Central , quase na esquina com General Tibúrcio, olhando para a Praça dos Leões.
Uma noite, quando as mulheres faziam o salão , pedindo suco de uva, para os que não ficavam para “dormir”, algumas já tiravam os longos , e a madame controlava o faturamento, irrompeu o fogo. A origem nunca se soube, como todo incêndio que se preza. E o fogo aumentava naquele local onde muitos jovens foram iniciados no sexo. Os poucos que ainda se encontravam na Praça do Ferreira esperando o ônibus da meia – noite, começou a notar a fumaça que vinha dos lados do Mercado Central. E, certamente, todos ficaram curiosos em saber o que estava acontecendo. E, quando ouviram a sirene dos bombeiros correram para lá. O canelau saiu em desabalada carreira em direção ao sinistro. E o perigo do incêndio ficou misturado com o show das meninas. Elas gritavam, pulavam e ameaçavam saltar lá de cima do sobrado. Foi quando o sereno gozando a cena , gritou em alto e bom som , na maior esculhambação: QUEIMA RAPARIGAL. Daí nasceu o ditado ainda hoje em evidência na cidade , com adaptação para QUEIMA QUEBENBAL.
( NARCÉLIO LIMAVERDE, NO LIVRO FORTALEZA, HISTÓRIAS E ESTÓRIAS – MEMÓRIAS DE UMA CIDADE, EDITORA ABC, 1999)


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