Paschoal Pery Gorrese – PY3DV
Estava vos contando com que responsabilidade e preocupação, o menino radioamador se lançava à construção do primeiro receptor de uma válvula, e com o material de outrem. Se não desse resultado, o que se faria com aquela “fortuna” gasta? Entretanto, a coisa saiu bem, e depois de trocar os fios da bobina de reação para que oscilasse, o receptor funcionou magnificamente. Foi um sucesso, e nosso pequeno construtor foi solicitado por outro colega para montagem de novo aparelho, que então já foi construído com “larga margem de segurança”.
Aqui se abre um parêntesis para prestação de duas justas homenagens: primeiro a Adalberto Rosa, tão precocemente roubado de nosso convívio, alma boa e amiga, que muito auxiliou nosso biografado, pois funcionário que era da Companhia Telefônica (oficinas) arrecadava material imprestável que era jogado fora, e presenteava-o ao modesto construtor para o qual tudo servia; o segundo homenageado é o técnico D. Rangel, que com sua bondade e proverbial cortesia, aturava o menino curioso com as suas perguntas, pois não era técnico em eletrônica, e sim em eletricidade, e carregava suas esquisitas baterias.
Retornemos à atividade do nosso construtor. Havia construído para outros, mas ainda não possuía o seu receptor, pois apesar de já ter reunido todo o material e construído as pilhas, aproveitando o carvão de outras usadas, e tendo como recipiente garrafas cortadas, faltava-lhe a válvula. Foi quando ganhou uma usada, já esgotada, não mais funcionando. Aí intentou uma “vigarice” que merece ser relatada, pois foi a primeira de sua vida… (Seria a última?)
O “brique” do Joaquim, na Rua da Praia, estava no auge de seu esplendor. Lá, de tudo havia. A maior parte das economias do nosso garoto lá havia ficado, infrutiferamente, pois grande parte do material adquirido era defeituoso e introcável, porque negócio feito era caso morto. Isto recalcara nosso construtor que desejava muito tirar uma desforra. Lá havia à venda, um receptor com uma válvula 441, por 80 mil réis e, dizia o vendedor, garantido. Como o nosso radioamador possuía uma válvula igual e cansada convidou o amigo “Seu Chico”, o velho Chico Baldino, da oficininha perto do Rocco, que a todos respondia: – ma naturale cat…, e que também fora lesado em diversas compras no brique, para uma tratantada.
Seu Chico iria ao brique e se interessaria pelo aparelho, levando num bolso a válvula cansada. Enquanto examinava o aparelho o vendedor seria distraído pelo nosso biografado que solicitaria outro objeto, dando tempo para que o primeiro “tratante” fizesse a troca das válvulas.
Tudo saiu às mil maravilhas, e os dois “vigaristas” desforrados retornaram rindo e vingados. Chegam em casa, experimentam e… Como? A válvula do Joaquim estava queimada…
Mais tarde, um dos colegas do garoto, feliz com as audições radiofônicas que lhe haviam sido possibilitadas, presenteou-o com uma válvula, que pelo agraciado foi escolhida: uma B443, porque nesta altura já se pensara em dar mais um passo, e construir um regenerativo elétrico (com corrente alternada) de duas válvulas.
Face os êxitos do novel-radioamador seu pai o presenteou com uma peça maravilhosa: um alto-falante que recebera em pagamento de dívida.
Iniciou-se a construção, primeiro pelo transformador, para o qual foram aproveitados um núcleo e fios da sucata da Telefônica, trazidos por Adalberto.
Neste tempo o garoto já sabia fazer cálculos de transformadores, mas a coisa se complicava porque os enrolamentos se deveriam fazer com o fio que se tivesse, e não com o que se indicava, o que obrigava a execução de enrolamentos duplos para funcionamento em paralelo, etc. Os núcleos eram pequenos (de telefone) e, por isto a relação espira-volt era grande, mas tudo foi vencido, e o transformador foi enrolado com quase cinco mil espiras contadas uma a uma, em camadas isoladas por papel de condensadores velhos.
Levou-se uns 15 dias neste trabalho, em que se aproveitava o tempo que sobrava depois da feitura dos temas do ginásio., freqüentado em dois turnos, naquele tempo.
Funcionou bem o transformador e conseguiu-se uma retificadora, isto é, uma válvula 201ª, triodo, já citado na primeira parte deste artigo e que se prestava a todos os fins. Arranjaram-se condensadores de papel de 2Mf. e para o filtro, um secundário de transformador de áudio (com primário queimado). Depois de muitas economias comprou-se uma detetora E-424, triodo já com aquecimento indireto, e funcionou um regenerativo Schnell.
O contentamento era grande, mas havia uma desconfiança, pois o volume de recepção era pequeno. Desconfiando-se da voltagem, conseguiu-se por empréstimo um voltímetro, enorme almanjarra industrial, e se aferiu a situação.
Os planos haviam sido feitos para que o pentodo de saída trabalhasse com 180 volts, e para tal havia sido enrolado o transformador, e com que sacrifício. Por que demônios somente se mediam 30 volts na “screen” da válvula, que era ligada num borne por fora do casquilho? Eis a explicação: a queda de voltagem no choque filtro inadequado era de 150 volts.
Almejava-se entretanto construir um Super-Hartley com válvulas apropriadas para as referidas funções, que aos poucos foram aparecendo, como a E-442 para amplificação de rádio-frequência, a E-424 como detetora e primeira de áudio, e a C-443, pentodo de saída. Mas isto era impossível com os recursos com que se contava, mesmo que nesta era já estivessem melhorados.
A maior parte dos esquemas da época eram conseguidos dos catálogos das casas de acessórios de rádio de Buenos Aires, e que eram de lá remetidos por simples solicitação. Neste, surgiram desenhos de transmissores monovalvulares, auto-excitados. Como nosso garoto já possuía um microfone velho que viera junto com a sucata da Telefônica, e cujo carvão fora desumedecido e arranjado convenientemente, pensou estar em condições de construir um emissor, e … mãos à obra. Não foi difícil conseguir ondas contínuas, o problema era modular.
Isto foi conseguido colocando o microfone ligado em série com a antena, e assim foi ouvido a três quilômetros, numa galena… Foi outro dos grandes momentos de sua “vida eletrônica”.
Mas tarde vieram os materiais já fabricados, como jogo de bobinas, transformadores, etc. que com maiores recursos financeiros tiraram um pouco do encanto desta vida de dificuldades e vitórias.
O garoto de ontem é hoje um Radioamador prefixado, mas continua convicto de que somente o trabalho de técnica, com suas dificuldades, seus problemas e naturais soluções, dá ao radioamador a verdadeira satisfação.
Colaboração de Ivan Dorneles Rodrigues – PY3IDR
e-mail: ivanr@cpovo.net Site: http://www.geocities.ws/py3idr
Estava vos contando com que responsabilidade e preocupação, o menino radioamador se lançava à construção do primeiro receptor de uma válvula, e com o material de outrem. Se não desse resultado, o que se faria com aquela “fortuna” gasta? Entretanto, a coisa saiu bem, e depois de trocar os fios da bobina de reação para que oscilasse, o receptor funcionou magnificamente. Foi um sucesso, e nosso pequeno construtor foi solicitado por outro colega para montagem de novo aparelho, que então já foi construído com “larga margem de segurança”.
Aqui se abre um parêntesis para prestação de duas justas homenagens: primeiro a Adalberto Rosa, tão precocemente roubado de nosso convívio, alma boa e amiga, que muito auxiliou nosso biografado, pois funcionário que era da Companhia Telefônica (oficinas) arrecadava material imprestável que era jogado fora, e presenteava-o ao modesto construtor para o qual tudo servia; o segundo homenageado é o técnico D. Rangel, que com sua bondade e proverbial cortesia, aturava o menino curioso com as suas perguntas, pois não era técnico em eletrônica, e sim em eletricidade, e carregava suas esquisitas baterias.
Retornemos à atividade do nosso construtor. Havia construído para outros, mas ainda não possuía o seu receptor, pois apesar de já ter reunido todo o material e construído as pilhas, aproveitando o carvão de outras usadas, e tendo como recipiente garrafas cortadas, faltava-lhe a válvula. Foi quando ganhou uma usada, já esgotada, não mais funcionando. Aí intentou uma “vigarice” que merece ser relatada, pois foi a primeira de sua vida… (Seria a última?)
O “brique” do Joaquim, na Rua da Praia, estava no auge de seu esplendor. Lá, de tudo havia. A maior parte das economias do nosso garoto lá havia ficado, infrutiferamente, pois grande parte do material adquirido era defeituoso e introcável, porque negócio feito era caso morto. Isto recalcara nosso construtor que desejava muito tirar uma desforra. Lá havia à venda, um receptor com uma válvula 441, por 80 mil réis e, dizia o vendedor, garantido. Como o nosso radioamador possuía uma válvula igual e cansada convidou o amigo “Seu Chico”, o velho Chico Baldino, da oficininha perto do Rocco, que a todos respondia: – ma naturale cat…, e que também fora lesado em diversas compras no brique, para uma tratantada.
Seu Chico iria ao brique e se interessaria pelo aparelho, levando num bolso a válvula cansada. Enquanto examinava o aparelho o vendedor seria distraído pelo nosso biografado que solicitaria outro objeto, dando tempo para que o primeiro “tratante” fizesse a troca das válvulas.
Tudo saiu às mil maravilhas, e os dois “vigaristas” desforrados retornaram rindo e vingados. Chegam em casa, experimentam e… Como? A válvula do Joaquim estava queimada…
Mais tarde, um dos colegas do garoto, feliz com as audições radiofônicas que lhe haviam sido possibilitadas, presenteou-o com uma válvula, que pelo agraciado foi escolhida: uma B443, porque nesta altura já se pensara em dar mais um passo, e construir um regenerativo elétrico (com corrente alternada) de duas válvulas.
Face os êxitos do novel-radioamador seu pai o presenteou com uma peça maravilhosa: um alto-falante que recebera em pagamento de dívida.
Iniciou-se a construção, primeiro pelo transformador, para o qual foram aproveitados um núcleo e fios da sucata da Telefônica, trazidos por Adalberto.
Neste tempo o garoto já sabia fazer cálculos de transformadores, mas a coisa se complicava porque os enrolamentos se deveriam fazer com o fio que se tivesse, e não com o que se indicava, o que obrigava a execução de enrolamentos duplos para funcionamento em paralelo, etc. Os núcleos eram pequenos (de telefone) e, por isto a relação espira-volt era grande, mas tudo foi vencido, e o transformador foi enrolado com quase cinco mil espiras contadas uma a uma, em camadas isoladas por papel de condensadores velhos.
Levou-se uns 15 dias neste trabalho, em que se aproveitava o tempo que sobrava depois da feitura dos temas do ginásio., freqüentado em dois turnos, naquele tempo.
Funcionou bem o transformador e conseguiu-se uma retificadora, isto é, uma válvula 201ª, triodo, já citado na primeira parte deste artigo e que se prestava a todos os fins. Arranjaram-se condensadores de papel de 2Mf. e para o filtro, um secundário de transformador de áudio (com primário queimado). Depois de muitas economias comprou-se uma detetora E-424, triodo já com aquecimento indireto, e funcionou um regenerativo Schnell.
O contentamento era grande, mas havia uma desconfiança, pois o volume de recepção era pequeno. Desconfiando-se da voltagem, conseguiu-se por empréstimo um voltímetro, enorme almanjarra industrial, e se aferiu a situação.
Os planos haviam sido feitos para que o pentodo de saída trabalhasse com 180 volts, e para tal havia sido enrolado o transformador, e com que sacrifício. Por que demônios somente se mediam 30 volts na “screen” da válvula, que era ligada num borne por fora do casquilho? Eis a explicação: a queda de voltagem no choque filtro inadequado era de 150 volts.
Almejava-se entretanto construir um Super-Hartley com válvulas apropriadas para as referidas funções, que aos poucos foram aparecendo, como a E-442 para amplificação de rádio-frequência, a E-424 como detetora e primeira de áudio, e a C-443, pentodo de saída. Mas isto era impossível com os recursos com que se contava, mesmo que nesta era já estivessem melhorados.
A maior parte dos esquemas da época eram conseguidos dos catálogos das casas de acessórios de rádio de Buenos Aires, e que eram de lá remetidos por simples solicitação. Neste, surgiram desenhos de transmissores monovalvulares, auto-excitados. Como nosso garoto já possuía um microfone velho que viera junto com a sucata da Telefônica, e cujo carvão fora desumedecido e arranjado convenientemente, pensou estar em condições de construir um emissor, e … mãos à obra. Não foi difícil conseguir ondas contínuas, o problema era modular.
Isto foi conseguido colocando o microfone ligado em série com a antena, e assim foi ouvido a três quilômetros, numa galena… Foi outro dos grandes momentos de sua “vida eletrônica”.
Mas tarde vieram os materiais já fabricados, como jogo de bobinas, transformadores, etc. que com maiores recursos financeiros tiraram um pouco do encanto desta vida de dificuldades e vitórias.
O garoto de ontem é hoje um Radioamador prefixado, mas continua convicto de que somente o trabalho de técnica, com suas dificuldades, seus problemas e naturais soluções, dá ao radioamador a verdadeira satisfação.
Colaboração de Ivan Dorneles Rodrigues – PY3IDR
e-mail: ivanr@cpovo.net Site: http://www.geocities.ws/py3idr
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