sexta-feira, 5 de agosto de 2011

políticos e radiodifusão - o que fazer diante de tal situação??

Observatório da Imprensa - 15 Anos Apoio: Fundação Ford

POLÍTICOS NA RADIODIFUSÃO

Deputados usam rádio e TV em campanha permanente

Por Roberto Kaz e Guilherme Brendler em 01/08/2011 na edição 653
Reproduzido da Folha de S.Paulo, 31/7/2011; título original “Vitrine parlamentar”, intertítulo do OI
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O deputado federal Anthony Garotinho (PR-RJ) apresenta de segunda a sexta o Fala Garotinho, programa da Rádio Manchete AM, do Rio de Janeiro.
Numa segunda-feira recente, o deputado não pôde comparecer, delegando o posto ao radialista Rodrigo Machado, que presenteou uma ouvinte com uma cadeira de rodas. E afirmou: “O Garotinho está há 35 anos no rádio. E quem tem Deus no coração gosta de ajudar os outros”.
Radialista de origem, Garotinho não abandonou o ofício após a posse. Mas há casos na mão oposta, de políticos que ingressaram no universo radiofônico e televisivo para divulgar seus mandatos.
De acordo com levantamento realizado pela Folha, entre os 513 deputados federais da atual legislatura, 53 participam de forma regular de programas de rádio ou TV, como apresentadores, colunistas ou entrevistados fixos.
Em São Paulo, o Dr. Ubiali (PSB-SP) chega a ter quatro aparições diárias no canal 15 da Net Franca, com seu Café com o Nosso Deputado. No Paraná, Zeca Dirceu (PT-PR) produz um programa semanal de 30 minutos, distribuído, segundo sua assessoria, para “5.000 rádios”.
A maior parte argumenta que as aparições são “prestações de contas à sociedade”.
Bom momento
É o caso de Glauber Braga (PSB-RJ), que lança mão de parte da verba indenizatória, subsídio a que todo congressista tem direito para custear despesas com o exercício da atividade parlamentar.
Os recursos com que ele compra espaço na Rádio Sociedade de Friburgo e em outras duas outras emissoras fluminenses são reembolsados pela Câmara Federal.
No primeiro semestre de 2011, Braga gastou cerca de R$ 23 mil para financiar suas transmissões. “A Câmara tem baixa representatividade. Qual é o remédio? A participação direta, não apenas em tempos de campanha. É o antídoto para que ninguém diga que não sabe o que o deputado está fazendo.”
Outros parlamentares também utilizam verba indenizatória para comprar espaços em rádio. Rogério Marinho (PSDB-RN) gastou, entre fevereiro e junho deste ano, R$ 21 mil em duas rádios.
No primeiro semestre, André Zacharow (PMDB-PR) pagou R$ 18 mil por espaço na rádio Marumby. Já Dilceu Sperafico (PP-PR) usou R$ 13.500 para divulgar via rádio suas atividades.
A lei eleitoral impede que candidatos comandem atrações televisivas ou radiofônicas em época de eleição, mas não há legislação que impeça a presença de políticos na mídia durante o mandato.
Apesar de os gastos estarem de acordo com as normas da Casa -desde que utilizadas para divulgar a atividade parlamentar-, o deputado José Carlos Araújo (PDT-BA), presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, diz não aprovar esse uso dos recursos.
“Da mesma forma que você fala sobre o seu trabalho, acaba batendo no seu adversário. Isso não é salutar.”
Araújo disse ainda que a proximidade das eleições é um bom momento para mudar as regras do uso de verba indenizatória e que pretende levar o tema à presidência da Câmara após o recesso.
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Sócios de rádio e TV são 10% do Congresso
Reportagem da Folha publicada em 29 de maio deste ano adiantou um cadastro do Ministério das Comunicações que informa todos os donos de emissoras rádios e TV no país.
Constam da lista 56 deputados federais e senadores que são sócios ou têm parentes no controle de emissoras. Segundo o ministério, o mapa passará a ser divulgado em caráter definitivo no seu site (www.mc.gov.br).
Entre os 56 congressistas que têm participação societária em emissoras de rádio ou TV, 12 são do PMDB. O DEM é o segundo partido com o maior número de proprietários de emissoras, com 11 congressistas na lista.
A lei permite que ocupantes de cargos no Executivo ou Legislativo sejam sócios de empresas de rádio e TV, mas proíbe que estejam à frente do comando das emissoras enquanto estiverem no exercício do mandato.
A crítica que se faz é ao uso das emissoras para alavancar candidaturas e usá-las contra adversários.
Em 2010, ano eleitoral, o número de concessões para rádios triplicou. Das 183 dadas pelo governo no ano passado, 76 têm ligação com políticos.
Segundo a reportagem, o governo quer mudar as regras para concessão de emissoras. A ideia seria exigir que parlamentares provem que têm capacidade para arcar os compromissos financeiros de uma emissora de rádio ou de televisão. (RK e GB)
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Programa de culinária é disputado por políticos
A deputada Íris de Araújo (PMDB-GO) apresenta há mais de dez anos um programa de culinária. Cozinhando com Dona Íris vai ao ar aos domingos, às 9h30, em Brasília pela TV Gênesis.
Em 2004, enquanto trocavam farpas no Congresso, os ex-senadores Ney Suassuna (PMDB-PB) e Heloísa Helena (PSOL-AL) prepararam juntos uma refeição. Quando era deputado, o vice-presidente, Michel Temer (PMDB-SP), também esteve no programa.
A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti (PT-SC), quando atuava no Senado, preparou na atração um prato de nome curioso: peixe de vadia.
“É muito fácil fazer. A receita é simples e rápida, acaba sobrando tempo para fazer as unhas e ir ao cabeleireiro”, disse Ideli, em 2004.
Após sair do ar por ter sido candidata em 2010, Íris voltou à TV no domingo passado. Ela diz esperar por um convidado especial: “Já chamei o Lula. Ele me disse que sua especialidade é macarrão à carbonara. A conferir”.
Presença é saudável
O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), entrevistado quinzenal do Faixa Livre, da Bandeirantes AM do Rio, diz que “sem slogan e tom clientelista”, a presença de políticos na mídia é saudável. “Principalmente em situações de debate.”
O jornalista Fernando Gabeira (PV-RJ), deputado federal de 1994 a 2010, diz que a legislação é demasiado permissiva: “A única regra é não usar os meios de comunicação durante as eleições. A Justiça só olha se é candidato”.
Para ele, o argumento de prestação de contas à sociedade não é suficiente. “Não acontece tanta coisa nova toda semana no Congresso. Grande parte é proselitismo”, conclui Gabeira. (R.K. G.B.)
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[Roberto Kaz e Guilherme Brendler são jornalistas da Folha de S.Paulo]

A MAGIA DE TORCER FUTEBOL - LEIA ESTE TEXTO DE EDUARDO GALEANO



O TORCEDOR

                                Uma  vez por semana, o torcedor foge de casa e vai ao estádio.
                        Ondulam as bandeiras, soam as matracas , os foguetes, os tambores , chovem serpentinas e papel picado: a cidade desaparece , a rotina se esquece, só existe o templo. Neste espaço sagrado, a única religião que não tem ateus exibe suas divindades. Embora o torcedor possa contemplar o milagre, mais comodamente , na tela de sua televisão , prefere cumprir a peregrinação até o lugar onde possa ver em carne e osso seus anjos lutando em duelo contra os demônios da rodada.
                        Aqui o torcedor agita o lenço, engole saliva , engole veneno, come o boné , sussurra preces e maldições , e de repente arrebenta a garganta numa ovação e salta feito pulga abraçando o desconhecido que grita gol no seu lado. Enquanto dura a missa pagã, o torcedor é muitos.  Compartilha com milhares de devotos a certeza de que somos os melhores, todos os juízes são vendidos, todos os rivais são trapaceiros.
                        É raro que o torcedor que diz:  “ Meu time joga hoje “. Sempre diz: “Nós jogamos hoje”. Esse jogador número doze sabe muito bem que é ele que sopra os ventos de fervor que empurram a bola quando ela dorme , do mesmo jeito que os outros onze jogadores sbaem que jogar sem torcida é como dançar sem música.
                        Quando termina a partida, o torcedor , que não saiu da arquibancada , celebra sua vitória , que goleada fizemos , que surra a gente deu neles, ou chora sua derrota, nos roubaram outra vez , juiz ladrão. E então o sol vai embora, e o torcedor se vai. Nos degraus  de cimento ardem , aqui e ali, algumas fogueiras de fogo fugaz, enquanto vão se apagando as luzes e as vozes. O estádio fica sozinho e o torcedor também volta á sua solidão , um eu que foi nós ; o torcedor se afasta, se dispersa, se perde e o domingo é melancólico feito uma quarta – feira de cinzas depois da morte do carnaval.
( EDUARDO GALEANO , in FUTEBOL AO SOL E À SOMBRA, Porto Alegre , L&PM,2010, p. 14 – 15)