sábado, 21 de janeiro de 2012

discussão sobre a cracolândia.

CRACOLÂNDIA: MAQUIAGEM?

Estou acompanhando a ação policial na Cracolândia, em São Paulo. A rua Helvetia foi ocupada. Traficantes presos. Sempre fico com um pé atrás com essas operações. Sinto que é uma tentativa de maquiar a cidade. Acaba-se com a Cracolândia em si. O povo aplaude. Ganham-se votos. Mas de fato, o que é feito pelos viciados  miseráveis que vivem lá?
Eu estive recentemente na Cracolândia, como escrevi na minha coluna da revista Época. Foi uma noite muito forte, porque talvez eu nunca tivesse convivido com a miséria humana nessa proporção. Jamais esquecerei os rostos magérrimos, encovados, sujos. Os olhares perdidos. O cheiro.
Mas também não vou esquecer da frase de um viciado com quem conversei:
– Os missionários vêm aqui e nos levam para tratamento, para a igreja. Mostram o que estão fazendo pela gente. E as verbas entram. Mas depois, a gente acaba aqui de novo.
Foi um depoimento amargo. Não concordo inteiramente com ele, pois os missionários tentam de fato retirar as pessoas do vício e de sua condição miserável. Muito mais que o poder público. Mas que a Cracolândia virou um símbolo, virou. Destruí-la tem uma ação simbólica. Pouco mais do que isso, porque o problema continua.
Segundo um ex policial com quem conversei, o que  a polícia está fazendo, de fato, é espalhar os viciados e traficantes pela cidade. Disse que já estão indo para a Praça da República e outros lugares do centro.
Daqui a pouco mostram a cidade bonitinha, em fotos, com as casas da Cracolândia recuperadas. Mas o problema continua o mesmo. Se estão enviando assistentes sociais e o pessoal da saúde, como o prometido, por que não fizeram isso antes da ação policial? Para de fato levantar o número de viciados, retirá-los, levar a tratamento?
E tem mais: soube que tem uma Cracolândia no Glicério. Outra próxima do Largo 13 em Santo Amaro.
Isso só em São Paulo. Cracolândias existem em todas as cidades do país, pelo que sei. E nas regiões agrícolas onde lavradores fumam crack para trabalhar.
Até quando vai continuar a maquiagem? Quando a questão vai ser encarada de frente, com um projeto sério e profundo para eliminar o crack e os traficantes? Ou alguém acha que o crack era produzido na própria Cracolândia?
Por falar nisso, a polícia que parece tão disposta a arrancar os miseráveis das ruas sabe onde o crack é fabricado, em São Paulo? Não seria por aí que devia começar?